A ADOÇÃO NÃO É APENAS UMA SOLUÇÃO PARA A ESTERILIDADE. Ela pode ser a escolha de casais com mais filhos ou que preferem adotar do que gerar uma criança. Não é possível falar em vantagens ou desvantagens da adoção como um prognóstico para casais estéreis, nem mesmo no que se refere ao risco de doenças genéticas. Tratase simplesmente de uma escolha consciente

Ao contrário do que se ouve falar, a adoção não aumenta a taxa de gravidez nos meses subsequentes ao momento em que é realizada. Na realidade, existe um fator que gera essa confusão. Muitas vezes, quem adota acabou de abandonar um tratamento de correção de diversos fatores da infertilidade Como uma parcela dos pacientes que abandonam o tratamento tende a engravidar, essas pessoas acabam engravidando. Em um estudo que pareou grupos que adotaram com pacientes que não adotaram, não houve diferença significativa na taxa de gravidez.

E inquestionável que a decisão de tentar ou não adotar uma criança é exclusiva do casal, mas faz parte do trabalho do esterileuta fechar um prognostico. Ele deve apontar ao casal os caminhos possíveis para a conquista de um bebé e, se o único caminho é a adoção, é seu dever colocálo claramente ao paciente. Indicar ou não a adoção em um prognóstico de infertilidade irreversível, no entanto, diz muito mais respeito a decisão e à disponibilidade afetiva do casal do que a orientações médicas

A confirmação de infertilidade incurável pode ser devastadora, mas manterse apegado a uma esperança sem fundamento é ainda mais prejudicial para o casal. Se não existem chances ou se elas são remotas, os parceiros devem conhecer e vislumbrar caminhos concretos: adotar um bebê ou mudar os projetos de vida. Depois de assimilada, a noticia da infertilidade incurável também tem o poder de aliviar um sofrimento continuo e de interromper o estresse da busca incessante, capaz de deixar a vida e o futuro do casal em suspenso. 

DIÁRIO DE UM ESTERILEUTA 

Um caminho mais curto 

Aquela consulta com Célia e Artur tinha sido intencionalmente marca da como a última do meu expediente. Sabia que seria uma conversa deli cada. Célia não poderia gestar um bebê em seu próprio útero e, embora ela tivesse os elementos para concluir qual seria o diagnóstico final, isto ainda não tinha sido conversado formalmente. Eu também sabia, pela convivência nos últimos meses, que os dois descartariam a idéia de uma barriga de aluguel. Chegava então a hora de falarmos seriamente sobre a possibilidade de uma adoção. O médico, no entanto, deve estar pronto para momentos mais complicados e a consulta de Célia e Artur naquele fim de tarde seria um momento difícil que eu teria de encarar

Antes de procurar meu consultório, Célia havia feito um tratamento com citrato de clomifene para aumentar sua ovulação, pois os exames não indicavam nenhum problema em Artur. No entanto, não houve resultados positivos. Na realidade, um bom tempo depois de ter interrompido o uso dos indutores, Célia chegou a ficar grávida, mas o acontecimento foi logo seguido de um aborto e, depois disso, todas as tentativas para engravidar por relações normais fracassaram

Célia e Artur chegaram ao meu consultório cheios de esperanças. Afinal, ela havia conseguido engravidar uma vez. Agora buscavam ajuda para uma nova tentativa, por meio da FIV, que incluísse o tratamento necessário para diminuir o risco de um outro aborto. Infelizmente, o caso não era tão simples

Uma radiografia revelou que Célia apresentava uma formação uterina. Como consequência, desenvolveu um útero bicorno, que é uma anatomia incompatível com a gestação de uma criança. Lembro bem como Celia ainda tentou se apegar à única esperança que tinha para engravidar. 

Ela teria que se submeter a uma cirurgia delicadíssima: unir as duas partes de seu útero para formar uma cavidade e, depois, passar por uma plástica interna. Durante muito tempo, teria de tomar altas doses de hormônio para desenvolver o endométrio da cavidade e, depois, ainda ar riscar uma FIV. Seu útero aceitaria um embrião? Era impossível ter certeza. Para o casal, no entanto, seria um sofrimento prolongado demais. Quem sabe, então, uma adoção

Como eu havia previsto, foram três horas de consulta muito emocionantes. Quando nos despedimos, percebi que Célia ainda precisaria chorar mais até assimilar tudo aquilo. Artur também se continha. sabiam tudo que precisavam fazer, mas como administrar as emoções? Não sei como isso foi feito pelo casal, que ficou mais de um ano sem dar noticias. Soube deles perto do Natal do ano seguinte, quando recebi um tele fonema de Boas Festas e uma ótima notícia. Os dois tinham um filhinho, um lindo menino, que adotaram. Sem dúvida, foi uma escolha muito pensada. Afinal, Célia ainda poderia tentar a sua última chance: tratarse cirurgicamente e recorrer à FIV. No entanto, ela descobriu um caminho mais curto para ter seu bebê

A adoção, no entanto, nunca é recomendada quando o casal não tem segurança de que amará essa criança mesmo que problemas futuros apareçam e eles podem aparecer, inclusive com filhos biológicos, essa possibilidade deve ser considerada da seguinte forma: filhos ficam doentes e tem problemas de origem genética ou desconhecida, sejam eles biológicos ou adotivos

E, no entanto, uma circunstância diferente na adoção que merece a atenção dos futuros pais. Tratase do fato de que a criança em situação de adoção tem um histórico do qual seus novos pais não fizeram parte. Sempre que possível, é importante tentar recuperar o máximo de informações sobre a fase de gestação, o parto e os antecedentes de doenças familiares. Quando essas in formações não existem, é aconselhável contar com um bom pediatra para os exames clínicos necessários. E um gesto de amor pela criança procurar saber o máximo a seu respeito